sexta-feira, agosto 05, 2011

COMO BARCOS VERMELHOS...

Post resgatado ao tempo...

 
Pintura: Jia Lu - Adrift

Ela abraçou as palavras e a seguir despiu-as, letra a letra, devagar, como barcos vermelhos que lhe saíam dos dedos. Em silêncio. Como um ser alado da noite. Criatura onírica, transparente, indizível e única. Trazia no espelho do olhar todas as mulheres que ousara ser. Olhou-o de frente, como se olhasse para a estrela da manhã, e murmurou-lhe:
'- E pela última vez te contarei como me pinto de asas em noites de paixão. E pela última vez te segredo que fui flor de papel de seda colorido e fui menina com tranças em frágeis laços de papel de lua e fui noiva em moldura de flor de laranjeira e fui palhaço de rábulas surrealistas e delirantes e fui princesa de povos mágicos e dolorosamente reais e fui pérola tão impossível de tão pura e fui segredo em silêncio de homens proibidos e fui mulher em chamas vestida de negro e fui jardim onde repousas as ternuras que não confessas e fui jóia que usaste ao peito como medalha e fui sereia para que tu fosses capitão e fui pirata para que usasses o tesouro que era meu. E hoje, meu amor, desejo apenas que digas o meu nome...'

Nina Castro, in 'Cartas a um Amor Futuro' (excertos)

1 comentário:

Giuseppe Pietrini disse...

Cheguei aqui e agora p'ra ler esta carta... quem dera fosse eu por quem alguém como tu espera... Eu que sou as palavras que se seguem, que encomendei a essa poetisa da planície ardente.

"Sou talvez a visão que alguém sonhou,
Alguém que veio ao mundo pra me ver,
E que nunca na vida me encontrou!"

Florbela Espanca