domingo, dezembro 17, 2006

METADE






METADE



Oswaldo Montenegro


(Texto que respeita a grafia original)



Que a força do medo que tenho não me impeça de ver o que anseio.
Que a morte de tudo que acredito não me tape os ouvidos e a boca.
Porque metade de mim é o que eu grito, mas a outra metade é silêncio.

Que a música que eu ouço ao longe seja linda, ainda que triste.
Que a mulher que eu amo seja sempre amada, mesmo que distante.
Porque metade de mim é partida e a outra metade é saudade.

Que as palavras que eu falo não sejam ouvidas como prece nem repetidas com fervor,
Apenas respeitadas como a única coisa que resta a um homem inundado de sentimento.
Porque metade de mim é o que eu ouço, mas a outra metade é o que calo.

Que essa minha vontade de ir embora se transforme na calma e na paz que eu mereço.
Que essa tensão que me corroe por dentro seja um dia recompensada.
Porque metade de mim é o que eu penso e a outra metade é um vulcão.

Que o medo da solidão se afaste, que o convívio comigo mesmo se torne ao menos suportável.
Que o espelho reflita em meu rosto o doce sorriso que eu me lembro de ter dado na infância.
Porque metade de mim é a lembrança do que fui, a outra metade eu não sei...

Que não seja preciso mais do que uma simples alegria para me fazer aquietar o espírito.
E que o teu silêncio me fale cada vez mais.
Porque metade de mim é abrigo, mas a outra metade é cansaço.

Que a arte nos aponte uma resposta, mesmo que ela não saiba.
E que ninguém a tente complicar porque é preciso simplicidade para fazê-la florescer.
Porque metade de mim é a platéia e a outra metade, a canção.

E que minha loucura seja perdoada.
Porque metade de mim é amor e a outra metade... também.

4 comentários:

Anónimo disse...

....emocionei-me,sorri com lágrimas,gosto taaaaannnto disto!
São sentires que me são tão...mas tão próximos,sorri,tinha saudades de ler isto!!!!
Adorei,ler isto quase ao acordar...obrigada.
beijinho grande,bom dia!
concha

Amaral disse...

Ainda que pareça confuso, não o é.
Apenas acontece que a maioria de nós não se apercebe dessa realidade.
Possuiremos nós duas metades?... Os grandes valores espirituais afirmam que sim porque, enquanto seres humanos, construímos desde cedo uma metade que vai servir de padrão a todas as decisões que iremos tomar pela vida fora.
É a metade que pensa, que se identifica com a forma, que se afirma perante a sociedade e perante o mundo em geral.
A outra metade...
é, como dizes, "o silêncio","o que calo", "um vulcão", o "eu não sei", "o abrigo", "a canção"...

Ainda que todos estes nomes, afinal, conduzam a um único: o amor.

O que nos parece evidente é que "somos" muito mais do que a metade que pensa. Esta alimenta-se de factos passados e futuros.
Se "esquecermos" o pensamento, o tal silêncio mental deixa-nos "ser" o momento presente, onde tudo acontece dentro duma perfeição e harmonia que só, desta forma, é percebida...

Catarina Alves disse...

Nina...

São metades assim que juntas fazem uma pessoa especial.

Mas fotos como esta, mesmo divididas, são sempre lindas...

Estes momentUS fazem com que surjam sentimentos e emoções... sorriso... lágrimas... alegria... triteza... junção de vários sentimentos.

Um abraço porque... porque sim.
Pelos ensinamentos, pelos momentos... por tudo.

Nani, mesmo que divida, feliz...

Delfim Peixoto disse...

Simplesmente lindo..
Jnhs de Bom Natal