Post recuperado...
(roubado ao tempo-esquecimento...)
Desafio da Cleopatra:
MOTE:
“Duma Carta”
Escrevi-te ontem
somente para dizer
das minhas mágoas e do meu amor…
O Sol morria…
Tudo era sombra em redor
e eu…, ainda escrevia…
A pena sempre a correr
sobre o papel,
deixava cintilações,
nas pedras do meu anel!
E a pena corria…
Nem precisava ver, o que escrevia!
Anoitecera.
…………………………………………
Como eu em toalha de altar
A mesa
revestiu-se de luar!…
Nascera a lua.
E a pena, nos bicos leves,
dizia ainda:
– Sou tua!
Por que é que me não escreves?
Mas o papel acabou
e a pena continuou:
Por que é que me não escreves?
O meu amor é todo teu.
Só eu te sei amar!
– Só eu!…
Janeiro
1922
Judith Teixeira
“Duma Carta”
Escrevi-te ontem
somente para dizer
das minhas mágoas e do meu amor…
O Sol morria…
Tudo era sombra em redor
e eu…, ainda escrevia…
A pena sempre a correr
sobre o papel,
deixava cintilações,
nas pedras do meu anel!
E a pena corria…
Nem precisava ver, o que escrevia!
Anoitecera.
…………………………………………
Como eu em toalha de altar
A mesa
revestiu-se de luar!…
Nascera a lua.
E a pena, nos bicos leves,
dizia ainda:
– Sou tua!
Por que é que me não escreves?
Mas o papel acabou
e a pena continuou:
Por que é que me não escreves?
O meu amor é todo teu.
Só eu te sei amar!
– Só eu!…
Janeiro
1922
Judith Teixeira
~*~
«Escrevi-te ontem
somente para dizer»
Que continuo aqui, parada no hoje. Como passageira adiada numa estação-desencontro, onde o comboio nunca tem o destino certo e onde as horas são sempre amanhã.
Se pelo menos soubesse falar-te de amores e lhes retirasse todas as rimas óbvias, gastas e repetitivas, com dores, talvez me aninhasse no silêncio de uma palavra onde esta distância-uivo-de-lua-nascente-mais-que-presente cessasse no agora e... para sempre. Mas onde e como esconder de ti o rio de fogo das saudades? Tudo passa, dizem. E todos os rios secam, dizem também. Menos um, feito abraço embalado e suspirado, por onde navegámos negando a solidão da noite. Lembras-te?
Mas eles, os que tanto dizem, não sabem.
…
E ninguém, nunca, saberá, que ainda permaneço deste lado do tempo onde sou tua.
Nem tu.
Nem tu...
«Por que é que me não escreves?»
Ni*
Fevereiro, 2009
5 comentários:
Escrevi-te ontem uma carta que, como as outras, não mandei.
Acabada a nossa relação tempestuosa, ficou, de entrada, o previsível vazio.
Depois, lentamente, foi-se insinuando uma ideia de alívio.
A minha saída de Lisboa e a chegada ao Alentejo ajudou muito.
Caras novas, novos desafios, mulheres lindas que olham com ar vagamente inquisidor o jovem profissional que chega de longe e que ninguém conhece.
Não sei porquê, tenho-me lembrado muito do poema “Desiderata”:
És um filho do universo, irmão das estrelas e árvores,
mereces estar aqui e, mesmo se não podes perceber,
a terra e o universo vão cumprindo o seu destino.
Procura, pois, estar em paz com Deus,
seja qual for o nome que lhe deres.
No meio do teu trabalho e nas aspirações, na fatigante jornada pela vida,
conserva, no mais profundo do teu ser, a harmonia e a paz.
Acima de toda mesquinhez, falsidade e desengano,
o mundo ainda é bonito.
Caminha com cuidado, faz tudo para ser feliz
e partilha com os outros a tua felicidade
Ao mesmo tempo lembro-me de outro poema cuja autoria já esquecim as que poderia ser de Thiago de Mello, que no seu final diz uma coisa neste género:
“Tu vais viver contigo até ao fim da tua vida.
Estima-te, ama-te a ti próprio, trata-te bem,
Sobretudo não te odeies a ti próprio.
Nunca te esqueças: vais viver contigo até ao fim da tua vida”.
Ah, minha querida e doce A., como estás longe deste universo, como nos afastámos tanto, como pudemos amar-nos sendo pessoas tão diferentes e vivendo em mundos tão tão conflituosos.
Agora, neste momento, tenho uma certeza que não mais me abandonará: por mais que te ame, não quero voltar a ver-te, fazes-me sentir indefeso e mau, provocas em mim instintos violentos de auto-defesa contra a tua envolvência tantalizante que me emociona e me derrete mas que eu sei que, como sempre, vai acabar mal.
Não.
Não quero voltar a ver-te.
Sei que me procuraste – felizmente eu não estava, mas as pessoas a quem perguntaste por mim ficaram impressionadas por uma mulher de tanta beleza e aparentemente tão doce e virtuosa procurar um tipo que decerto não te merece.
Acabam por ter razão, mas ao contrário e sem o saberem: eu não te mereço – mereço muito mais, pelo menos aspiro a muito mais e começo a gostar de mim, abominável prática à qual tu nunca te habituarias.
Por isso mesmo nem sequer te mando esta carta.
Quero ser feliz, livre do teu fantasma.
Sou um filho do universo e mereço ser feliz, como dizem os poetas, e bem.
E ponto final.
100 anos... 'uauuuuuu!!!!'
...
Arrebatador... tudo o que escreveste!
Força, convicção... determinação.
Gostei! Muito. Mesmo muito!
«Acabam por ter razão, mas ao contrário e sem o saberem: eu não te mereço – mereço muito mais, pelo menos aspiro a muito mais e começo a gostar de mim, abominável prática à qual tu nunca te habituarias.»
Estonteantemente forte e corajoso!
Abraço embalado
Ni*
Obrigado, Ni.
Os pensamentos que plasmei no comentário correspondiam mais ou menos ao turbilhão contraditório que eu sentia no idos de 80, já lá vão quase 30 anos.
Eu e a A. estávamos quase na casa dos trintas e ficámos "caídos" um pelo outro a contragosto... de ambas as partes, verdade seja dita.
Era uma relação impossível, demasiado conflituosa para ter algum jeito.
Aquilo tinha de acabar e acabou mesmo.
Não tenho a menor dúvida de que se não tivesse tido a força necessária para cortar, hoje já estaria mais do que divorciado da dita, com todos os custos e toda a dor associada.
Com aquele dramalhão aprendi uma grande lição: tenho, antes do mais, que ser fiel e leal a mim próprio - se tentar ser quem não sou, o resultado será sempre disparatado.
Um abraço e obrigado pelo calor do acolhimento.
100
Gosto muito do teu modo de ser 'verdadeiro e lúcido'!
A lucidez é algo que está a rarear, amigo 100! E aliada a essa tua lucidez... sempre... sempre... a força da verdade dos afectos... a sensatez... a honra... que mantém a balança equilibrada. A sensibilidade, tão necessária aos olhos com que absorvemos o mundo... é também uma das marcas da tua passagem por esta vida!
'Gosto-te!'... :)
Ni
... desencontrei-me de ti ... e só eu sei. Só eu.
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